segunda-feira, 29 de agosto de 2011

CARTA AOS IRMÃOS [3] - 1 º GRAU


CARTA AOS IRMÃOS [3]

Edição 514 - Publicado em 11/Junho/2011 - Página 41

As divindades celestiais testam a nossa fé

Esta provação, mais que qualquer outra, confirmará sua genuína fé, e as dez filhas-demônios do Sutra de Lótus com certeza os protegerão. O demônio que apareceu diante do garoto Montanhas de Neve39 para testá-lo era, na verdade, Shakra.40 A pomba que foi salva pelo rei Shibi41 era o rei celestial Vaishravana.42 É até possível que as dez filhas-demônios43 tenham possuído seu pai e o estejam atormentando a fim de testar sua fé (WND, v. 1, p. 497).
Na sequência, Nitiren Daishonin assegura aos irmãos Ikegami que a fé genuína por eles demonstrada lhes garantirá a proteção das divindades celestiais, que, no Sutra de Lótus, juraram proteger os praticantes desse sutra. Mas logo ele acrescenta que, muitas vezes, tais divindades procuram testar a fé das pessoas para verificar se é ou não verdadeira. Isso, Daishonin diz, assemelha-se ao episódio em que a divindade Shakra adotou a forma de um demônio para testar o espírito de procura do menino 
Montanhas de Neve, ou quando o rei celestial Vaishravana, sob a forma de uma pomba, põe à prova a benevolência do rei Shibi.
Fundamentando-se nesse princípio, Dai­sho­nin sugere que a provação dos irmãos — o deserdamento do mais velho pelo pai por causa da prática budista — provavelmente fora gerada pela função das dez filhas-demônio que estavam influenciando negativamente o pai para atormentá-los e testar-lhes a fé.
Em outros escritos, o Buda Nitiren analisa esse princípio de que as funções universais criam obstáculos para testar a fé dos seguidores. Por exemplo, durante a Perseguição de Atsuhara,44 um grupo de camponeses seguidores de Daishonin foi submetido a cruel interrogatório do poderoso oficial Hei no Sae­mon,45 em virtude da fé que eles praticavam. Contudo, por um instante sequer, esses seguidores abandonaram suas crenças. Mas, mesmo enfrentando a perseguição das autoridades, continuaram a recitar o Nam-myoho-rengue-kyo intrepidamente. Assim que soube das notícias, Daishonin escreveu [a Nikko Shonin e a outros discípulos próximos] uma carta intitulada “Resposta aos sábios”: “Estou certo de que as dez filhas-demônio devem ter se apoderado de Hei no Saemon, induzindo-o a testar a fé desses devotos do Sutra de Lótus. Isso se assemelha ao modo como o garoto Montanhas de Neve e o rei Shibi foram testados. [Ou talvez] à forma como um demônio maléfico se apoderou de Hei no Saemon” (WND, v. 2, p. 831).
Aqui, Daishonin diz que as dez filhas-demônio [consideradas divindades celestiais] ou então um demônio maligno provavelmente havia “se apoderado” de Hei no Saemon.
Na primeira parte desta explanação, examinamos a perseguição que recaía aos praticantes do Sutra de Lótus da perspectiva de ser esta uma função dos demônios malignos — em especial, as ações do Rei Demônio do Sexto Céu, que se apodera ou influencia negativamente pessoas de sabedoria, governantes e pais para atormentar os praticantes.
Por que então divindades celestiais como as dez filhas-demônio, que são funções protetoras do Universo, teriam de valer-se de Hei no Saemon para testar a fé dos camponeses de Atsuhara?
No Budismo, a causa para atingir a iluminação é a fé inabalável. Os obstáculos são vistos como uma consequência lógica da decisão de manter a fé no ensino correto, o Sutra de Lótus. Assim, o “xis” da questão é: diante das grandes dificuldades e contratempos, somos consumidos pelo medo e abandonamos a fé, ou nos munimos de coragem e continuamos a avançar?
Se nossa determinação for fraca e abandonarmos a fé, significa que fomos vencidos pelos tormentos do Rei Demônio do Sexto Céu. Mas se triunfarmos sobre essas difíceis provações com firme determinação e mantivermos uma fé inabalável, conseguiremos perceber que também podemos sair vitoriosos de uma prova imposta pelas divindades celestiais. Em outras palavras, tudo depende de nosso coração ou de nossa decisão. A proteção das divindades celestiais, em essência, nada mais é que o poder de nossa própria fé.
O Sr. Toda declarou: “Nitiren Daishonin afirma no Gosho que ele considera Hei no Saemon — um arqui-inimigo do Budismo que perseguiu o Buda incessantemente — como bom amigo ou influência positiva em sua prática budista.46 Nunca temam os inimigos! 
Seus ataques são apenas um vendaval que nos ajuda a aprimorar e atingir o estado de Buda”.
Este é o espírito audaz do Budismo Nitiren. É importante termos uma determinação indomável, livre do medo.
Daishonin cita com frequência em seus escritos a frase do Grande Mestre Miao-lo,47 da China: “Quanto mais firme é a fé, maior é a proteção dos deuses”.48 As funções universais, sem falta, protegerão os praticantes do Sutra de Lótus que possuem fé genuína.
Na carta “Resposta aos sábios”, citada há pouco, Nitiren Daishonin também esclarece que os budas Sakyamuni e Muitos Tesouros, assim como os budas das dez direções e as divindades celestiais, formularam o solene juramento de proteger os devotos do 
Sutra de Lótus, na assembleia em que o Sutra estava sendo pregado (Cf. WND, v. 2, p. 831). Ele diz que, segundo o princípio da “transformação do veneno em remédio”,49 as retribuições ou os efeitos serão de acordo com as ações, boas ou más.
De fato, o que importa é o coração. Nossa fé, em última análise, é o que determina a vitória no futuro.
O poeta e romancista alemão Hermann Hesse (1877-1962) escreveu: “Somente os que possuem a coragem de cumprir com seu destino podem ser chamados de heróis” (HESSE, Hermann. Eigensinn [Obstinação]. In: Gesammelle Werke [Obras Completas].
Frankfurt: Suhrkamp Taschenbuch Verlag, v. 10, p. 457, 1987). As pessoas que acreditam que tudo começa com a própria mudança interior são indivíduos de verdadeiro heroísmo e coragem, e podem estabelecer na vida uma felicidade real e duradoura.
Manter firme fé no momento decisivo
Qualquer fraqueza na fé será a causa para o arrependimento. O veí­culo que capota logo à frente é um alerta para quem vem atrás (WND, v. 1, p. 497).
“Qualquer fraqueza na fé será a causa para o arrependimento.” Para os que praticam o Budismo Nitiren, essas palavras devem ser lidas como uma advertência rigorosa.
Em síntese, tudo depende de: até que ponto compreendemos a boa sorte que temos por conhecer “uma pessoa que expõe este sutra exatamente como ele ensina” e por dedicarmo-nos com essa pessoa, tendo-a como mestre, para propagarmos a Lei Mística. Se nossa fé ou determinação for fraca no momento decisivo, nos restará um eterno arrependimento.
Quando enfrentamos obstáculos no curso da prática budista, na realidade, estamos diante de um momento de decisão capaz de mudar nossa vida, e de definir se abriremos as portas para atingir o estado de Buda eterno por meio da fé inabalável, ou se fecharemos o caminho para a felicidade como consequência de ter abandonado a fé.
Sempre que estivermos diante de grandes obstáculos, devemos desafiar com intrépida postura, recordando esta passagem de “Abertura dos olhos”: “Meus discípulos e eu, mesmo que ocorram vários obstáculos e maldades, desde que não se crie a dúvida no coração, atingiremos naturalmente o estado de Buda. Não duvidem dos benefícios do Sutra de Lótus, mesmo que não haja proteção dos céus. Não lamentem a ausência de segurança e tranquilidade na vida presente. Embora tenha ensinado dia e noite a meus discípulos, todos, criando a dúvida, abandonaram a fé. O que é costumeiro no tolo é esquecer nas horas cruciais o que prometera nas horas normais” (END, v. 4, p. 209-210).
A perpetuação da Soka Gakkai depende da aplicação dessa passagem na vida de seus integrantes. Se continuarmos avançando tendo essas palavras de Daishonin como ponto de referência, nossa fé resplandecerá com brilho indestrutível.
Com base no espírito que essa frase ensina, todas as vezes que enfrentamos uma dificuldade, isso equivale às “horas cruciais”. Portanto, é fundamental termos esse tipo de fé intrépida que nos permita contra-atacar com coragem em momentos assim — por exemplo, quando os três obstáculos e as quatro maldades investem contra nós, ou quando somos desafiados pelo nosso carma, ou então quando estamos engajados numa luta decisiva em prol do Kossen-rufu, em que é tudo ou nada. Devemos compreender que cada dia é uma oportunidade para aprender essa postura de fé, tomando como referência o exemplo de Nitiren Daishonin. Jamais devemos ser pessoas tolas que retrocedem no momento crucial.
Se nossa fé for débil ou superficial, se agirmos como tolos, viveremos à deriva, como plantas aquáticas arrastadas pela correnteza, sem qualquer propósito fundamental. Os seres humanos são criaturas que sempre buscam um sentido para a vida. Por meio dessa busca eterna, é possível encontrar um significado infinitamente profundo para a sua existência. Os membros da Soka Gakkai podem aprofundar a fé e o sentido da vida de forma infinita, pois são especialistas na arte de viver e de ser feliz.
“Cerrem os dentes e jamais esmoreçam na fé”
Não obstante, cerrem seus lábios e jamais esmoreçam em sua fé. Sejam corajosos como Nitiren na ocasião em que ele agiu e advertiu Hei no Saemon-no-jo. Apesar de não seguirem o caminho da iluminação, os filhos do lorde Wada e do governador Wakasa,50 bem como os guerreiros sob o comando de Masakado e Sadato,51 lutaram até a morte a fim de preservarem sua honra. A morte vem para todos, ainda que tudo pareça normal. Por isso, jamais sejam covardes, ou se tornarão alvos de zombarias (WND, v. 1, p. 498).
Daishonin não se cansa de encorajar os irmãos Ikegami, que passavam por dificuldades por conta da fé, e lhes diz: “Não devem demonstrar nem sentir temor” e “Jamais esmoreçam na fé”.
Estabelecer um estado sereno de felicidade que nada pode destruir — eis o propósito de nossa fé e prática budista. Assim, por meio do encorajamento, Daishonin solicita aos irmãos que considerem a luta como uma oportunidade, não só para polir e melhorar o caráter, mas também para se manterem imperturbáveis diante de qualquer obstáculo.
O Budismo Nitiren é um ensino centrado na unicidade de mestre e discípulo. Se o mestre é um rei leão, os discípulos também são reis leões. Dessa forma, o mestre solenemente exorta os sucessores a observar e seguir o exemplo dele. Conforme indica a frase: “Sejam corajosos como Nitiren na ocasião em que ele agiu e advertiu Hei no Saemon-no-jo”, Daishonin instrui os irmãos a perseverar na fé e lutar destemidos com o mesmo espírito resoluto que ele demonstrou em todas as batalhas.
Essa menção à conduta de Nitiren Daishonin perante Hei no Saemon se refere às duas advertências feitas pelo primeiro ao segundo, que era a figura política mais poderosa na época. Uma das advertências foi apresentada em decorrência da Perseguição de 
Tatsunokuti, em setembro de 1271, e a outra quando Daishonin foi perdoado de seu exílio na Ilha de Sado, em abril de 1274. Em Tatsunokuti, Daishonin declarou com forte convicção a Hei no Saemon: “Nitiren é o pilar e a viga do Japão. Ao livrar-se de mim, estará derrubando o pilar da nação!” (WND, v. 1, p. 579)
Depois de regressar a Kamakura, vindo da Ilha de Sado, ele também disse claramente a Hei no Saemon: “Pode ser que, por ter nascido dentro dos domínios do regente, eu deva mostrar-lhe obediência em minhas ações. Porém, jamais o seguirei em meu coração” (Ibidem). Em particular, Daishonin referia-se ao regime autoritário do governo militar de Kamakura: embora fisicamente fosse obrigado a se submeter às ordens dos governantes, jamais poderiam forçá-lo à obediência espiritual, já que ele era o único soberano de suas convicções.
Estas foram declarações resolutas, corajosas, sem o menor sinal de servilismo ou temor. Do mesmo modo, os discípulos que abraçam o coração de Daishonin e espelham a própria conduta nele nada têm a temer. Podem evidenciar uma infinita força e 
energia, unindo-se à luta de Daishonin e adotando a postura dele.
A propósito, essa última citação, que pertence ao escrito “A seleção do tempo”, foi incluída na antologia “Os direitos humanos”, uma coletânea inspiradora de frases sobre direitos humanos compilada pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) (Birthright of Man: A Selection of Texts [Os direitos humanos: Seleção de textos]. HERSCH Jeanne. (Ed.). Paris: Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 1969. p. 127].
Voltando à “Carta aos Irmãos”, Daishonin observa: “A morte vem para todos, ainda que tudo pareça estar normal”. Esta é uma das frases de Nitiren Daishonin que me causou profunda impressão no curso de meus mais de cinquenta anos de prática budista.
Como seres humanos, todos nós morreremos um dia. Ninguém pode evitar essa rea­lidade. O importante é como utilizamos esta existência única e preciosa. Numa carta endereçada ao jovem discípulo Nanjo Tokimitsu,52 Nitiren Daishonin afirma: “Visto que a morte é a mesma em qualquer um dos casos, o senhor deveria estar disposto a oferecer a vida em prol do Sutra de Lótus. Pense nesse oferecimento como uma gota de orvalho que se reintegra ao oceano ou uma partícula de pó que retorna à terra” (WND, v. 1, p. 1003).
Nesse mesmo sentido, o Sr. Toda costumava dizer: “A morte é momentânea, mas a vida é eterna. Os membros da Soka Gakkai içaram o grande estandarte do Kossen-rufu. Esta é, de fato, a ‘era do Kossen-rufu’. Devemos ser corajosos” (TODA, Jossei. Toda
Josei Zenshu [Coletânea de Escritos de Jossei Toda], v. 1, p. 60).
Com essas palavras, o presidente Toda levantou-se sustentando o estandarte da propagação da Lei Mística, e avançou para que a Soka Gakkai concretizasse a meta de 750 mil famílias.
Certa ocasião, ele disse aos integrantes da Divisão dos Jovens: “Quando vocês morrerem e ocuparem seus lugares junto dos discípulos de Sakyamuni, no Pico da Águia,53 se alguém ali zombar de vocês, dizendo: ‘Os jovens dos Últimos Dias são um bando de 
covardes’, então vocês não são dignos do título de Bodhisattvas da Terra” (Ibidem, p. 59).
Essas rigorosas palavras de encorajamento estão de acordo com a advertência de Daishonin: “Jamais sejam covardes, ou se tornarão alvo de zombarias” (WND, v. 1, p. 59).

Combater as funções malignas é a essência da fé genuína

Os três obstáculos que aparecem nessa passagem são os obstáculos dos desejos mundanos, do carma e da retribuição. O obstáculo dos desejos mundanos indica os impedimentos à prática causados pela ganância, ira, estupidez54 e outros parecidos; o obstáculo do carma representa os impedimentos causados por esposa ou filhos, e o obstáculo da retribuição são os impedimentos provocados pelo soberano ou pelos pais. Das quatro maldades, as funções do Rei Demônio do Sexto Céu55 são desse último tipo.
No Japão atual, muitas pessoas declaram ter dominado a prática de concentração e discernimento.56 No entanto, existe realmente alguém que tenha enfrentado os três obstáculos e as quatro maldades? (WND, v. 1, p. 501)
A seguir, em benefício dos irmãos Ikegami, Daishonin descreve algumas das formas específicas com que os três obstáculos e as quatro maldades se manifestam. E faz também alusão ao fato de que seus seguidores e ele, na leal batalha contra as funções malignas, são os únicos na época atual que estão realmente praticando o ensino correto.
Ele analisa, em primeiro lugar, os “três obstáculos” — aqueles que atuam na obstrução da prática budista e minam as boas causas acumuladas na vida da pessoa. A lista de obstáculos varia de forma considerável, dependendo do sutra ou do tratado. O Sutra do Nirvana e várias outras escrituras referem-se aos três tipos de obstáculos — os dos desejos mundanos, do carma e da retribuição.
1. O obstáculo dos desejos mundanos corresponde aos impedimentos à prática, os quais se originam dos três venenos da avareza, ira e estupidez na vida da pessoa e assim por diante. Os desejos mundanos, ou os impulsos originados da ilusão, enfraquecem a energia vital das pessoas, tiram-lhes a razão e até mesmo roubam-lhes a energia que alimenta sua vida.
2. O obstáculo do carma está relacionado com os impedimentos originados da influência negativa do carma gravado na vida da pessoa, que age para obstruir a prática budista. Isso se aplica no caso em que a pessoa sai do caminho correto da prática budista por causa de suas atitudes equivocadas ou dos maus atos.
3. O obstáculo da retribuição refere-se aos obstáculos provenientes dos efeitos negativos ocasionados pelas graves ofensas cometidas em existências passadas. Um excelente exemplo dessa punição está em nascer numa época de corrupção ou num ambiente hostil à prática budista ou que não a apoia.
Na “Carta aos Irmãos”, Daishonin apresenta exemplos concretos desses três obstáculos num contexto relevante aos irmãos Ikegami. Ele explica assim que o obstáculo do carma corresponde aos “impedimentos causados pela esposa ou pelos filhos”, ao passo que o obstáculo da retribuição refere-se aos “impedimentos apresentados pelo soberano ou pelos pais” (Cf. WND, v. 1, p. 501). Quero esclarecer especificamente que as pessoas que impedem a prática budista de outra — tal como o cônjuge ou os filhos, ou o governante ou os pais, conforme mostra Daishonin — nada mais são que funções ou influências negativas (“maus amigos”); elas não são más na essência. Por fim, cabe inteiramente a cada praticante permanecer firme ou abandonar a fé em consequência da oposição de outras pessoas. Quando vencemos a nós próprios, conseguimos enxergar cada indivíduo como um “bom amigo”, ou uma influência positiva para nossa vida. Enfatizando ainda mais esta questão: ao realizar uma mudança bem no interior de nossa vida, conseguimos mudar também, ou exercer uma influência positiva na vida dos outros.
Nitiren Daishonin examina, em seguida, as “quatro maldades”. O termo “maldade” ou “função maligna”, no Budismo, origina-se da palavra sânscrita mara, traduzida para o chinês de diferentes formas, como “assassino”, “ladrão de vida” ou “destruidor”.
Esse termo é relativo às funções negativas no coração da pessoa, as quais procuram destruir o espírito dela e até mesmo tirar-lhes a vida.
Como no caso dos obstáculos, há também vários tipos de maldades descritas em diferentes sutras e tratados. A descrição das quatro maldades como impedimentos dos desejos mundanos, dos cinco componentes,57 da morte e do Rei Demônio consta em obras como o Tratado sobre a Grande Perfeição da Sabedoria.58
1. O impedimento dos desejos mundanos refere-se aos impulsos derivados da ilusão, que atormentam, provocam confusão espiritual e inibem a sabedoria nas pessoas.
2. O impedimento dos cinco componentes, que inclui o impedimento da doença, corresponde ao desequilíbrio nos cinco componentes (por exemplo, a mente e o corpo), produzindo sofrimento e angústia que acabam levando à destruição da fé da pessoa.
3. O impedimento da morte significa um praticante sendo despojado da vida — isto é, morrendo — e a morte da pessoa faz posteriormente que outros praticantes duvidem da fé.
4. O impedimento do Rei Demônio significa a fé dos praticantes, destruída pelas funções do Rei Demônio, também conhecido como “Demônio que se Regozija em Manipular Livremente as Pessoas e em Usurpar o Fruto dos Esforços Delas”.
Das quatro maldades, Nitiren Daishonin menciona aqui apenas o impedimento do Rei Demônio. Isso porque ele enfocava o tipo de impedimento que os irmãos Ikegami enfrentavam.
Até este trecho da carta, ele orientou em vários pontos sobre a necessidade de ter uma fé resoluta para enfrentar as funções insidiosas do Rei Demônio. No encerramento, conclui que somente seus seguidores e ele podem provocar o ataque dos três obstáculos e das quatro maldades e triunfar sobre eles. Isso fica implícito em sua pergunta retórica: “Existe alguém que realmente tenha enfrentado os três obstáculos e as quatro maldades?” (WND, v. 1, p. 501) Ele observa que há muitas pessoas que 
“afirmam ter dominado a prática de concentração e discernimento [ensinada por Tient’ai como a prática correta para atingir a iluminação]”. Mas, pergunta ele, quem está sendo atacado pelos três obstáculos e pelas quatro maldades? A resposta dispensa explicações: exceto Daishonin e seus seguidores, ninguém mais.
Por meio de nossos dedicados esforços em prol do Kossen-rufu como membros da Soka Gakkai, unidos pelo mesmo comprometimento de mestre e discípulo, damos continuidade a este nobre espírito de luta de Nitiren Daishonin. Com isso, na época atual, demonstramos que somos os únicos que real­mente enfrentamos os três obstáculos e as quatro maldades.
Em novembro de 1942, no auge da Segunda Guerra Mundial, a Soka Kyoiku Gakkai (literalmente, Sociedade Educacional de Criação de Valores, precursora da Soka Gakkai) realizou sua 5ª Convenção. No discurso proferido nessa ocasião, no qual tratou dessa mesma passagem da “Carta aos Irmãos”, o Sr. Makiguti declarou: “Quem dentre os tradicionais praticantes da Nitiren Shoshu [ou seja, o clero] foi atacado pelos três obstáculos e pelas quatro maldades? (...) Os que dizem conduzir os outros mas que não 
provocam o surgimento de obstáculos não seriam como ‘guardiães do inferno que levam os outros aos maus caminhos’? (Ibidem) Ser atacado pelas funções malignas é o que distingue os ‘praticantes’ dos meros ‘seguidores’. (...)
“As pessoas que vivem uma existência dedicada ao bem menor e que praticam a fé somente para o próprio benefício, com certeza, não enfrentarão obstáculos; mas aqueles que vivem em prol do bem maior, dedicados à altruística prática de bodhisattva, certamente serão atacados pelas funções malignas. (...)
“Assim como as flores de lótus que desabrocham sem ser maculadas pelas águas lamacentas onde crescem, nós [membros da Soka Gakkai] nos lançamos corajosamente no meio das forças hostis ao ensino correto — interagimos com pessoas dedicadas ao bem menor e ao bem relativo que caluniam a Lei — e procuramos corrigir seu grave erro e suas más ações. Portanto, é natural que os três obstáculos e as quatro maldades caiam furiosamente sobre nós. De fato, o surgimento deles faz que possamos ser 
chamados ‘praticantes’” (MAKIGUTI, Tsunessaburo. Makiguchi Tsunesaburo Zenshu [Obras Completas de Tsunessaburo Makiguti]. Tóquio: Seikyo Shimbunsha, v. 10, p. 152-153, 1987).
Não devemos ser “seguidores” fracos que desejam apenas o benefício menor para si próprios e que sentem muito medo de combater as funções malignas. Os autênticos “praticantes” são aqueles que se lançam com toda seriedade na batalha contra os três obstáculos e as quatro maldades, aspirando ao grande benefício de atingir o estado de Buda nesta existência e propagar o Kossen-rufu para a felicidade de todas as pessoas. Todos os membros da Soka Gakkai são nobres “praticantes do Sutra de Lótus” da era moderna.

Combater as funções malignas que fazem as pessoas caírem nos maus caminhos

A afirmação [de Grande Concentração e Discernimento relacionada aos três obstáculos e às quatro maldades] “Se uma pessoa cai sob a influência deles, ela será conduzida para os maus caminhos” indica não somente os três maus caminhos, mas também os mundos dos seres humanos e celestiais e, no geral, todos os nove mundos.59 Por essa razão, com exceção do Sutra de Lótus, todos os sutras — os dos períodos Guirlanda de Flores, Agama, Exatidão e Igualdade, Sabedoria, Nirvana e Mahavairochana — conduzirão as pessoas aos maus caminhos. Além disso, com exceção da escola Tendai,60 os adeptos das outras sete escolas61 são, na verdade, guardiães do inferno62 que levam outros aos maus caminhos. Mesmo na escola Tendai há aqueles que professam a fé no Sutra de Lótus; apesar disso, na realidade, conduzem outros aos ensinos pré-Sutra de Lótus. Eles também são os guardiães do inferno que fazem as pessoas caírem nos maus caminhos (WND, v. 1, p. 501).
Nitiren Daishonin cita aqui a passagem relacionada aos três obstáculos e às quatro maldades que consta em Grande Concentração e Discernimento: “Se a pessoa cair sob sua influência, será levada aos maus caminhos”. Os sacerdotes de várias escolas budistas da época de Daishonin, por terem propagado ensinamentos errôneos por todo o país, agiram como “maus amigos”, ou influências negativas, fazendo que as pessoas caíssem nos maus caminhos. Daishonin descreve essas pessoas como “guardiães do inferno” que levam os outros aos três maus caminhos e aos nove mundos dos ensinamentos pré-Sutra de Lótus [os quais articulam uma separação clara entre os nove mundos e o estado de Buda]. Ele declara ainda que, mesmo na escola Tendai, onde originariamente se valorizava o Sutra de Lótus, há aqueles que, embora professem a fé nos ensinos desse sutra, agem, na verdade, como “guardiães do inferno” por levarem as pessoas a cair nos maus caminhos e descartar o Sutra de Lótus.
Durante 1275 e 1278 [correspondente à era Kenji e ao primeiro período após ter-se mudado para o monte Minobu], Daishonin intensificou as críticas a Jikaku e Chisho,63 patriarcas da escola Tendai que haviam criado a causa fundamental para a calúnia contra o Sutra de Lótus por todo o Japão ao incorporarem as doutrinas esotéricas da escola Preceitos-Verdadeira Palavra aos ensinamentos originais da Tendai. Esses sacerdotes, que deveriam ter preservado o Sutra de Lótus, deturparam os ensinos da escola e, como resultado, tornaram-se pessoas que “destroem o Sutra de Lótus”.
Numa época em que as pessoas eram profundamente influenciadas por esses ensinamentos errôneos e pela calúnia contra a Lei que existia por todo o país, Daishonin enfrentou diretamente os sacerdotes a quem as pessoas consideravam como fortalezas de sabedoria, denunciando-os como a verdadeira fonte desse mal fundamental da calúnia. Uma vez que se lançou a uma batalha “tão feroz como a que o Buda e o Rei Demônio travaram”,64 é inevitável que os três obstáculos e as quatro maldades caíssem sobre ele como vingança.
Os irmãos Ikegami estavam entre os leais discípulos de Daishonin que o apoiaram e compartilharam o peso dos ataques desferidos por essas forças hostis. Nesta carta, pede-lhes outra vez, com toda firmeza, que continuem a lutar com ele para propagar o ensino correto.

Uma vida vitoriosa conduzida pelo princípio de que o que importa é o coração

Uma passagem do Sutra Seis Paramitas65 afirma que devemos nos tornar mestre de nossa mente, e não deixar que ela nos domine.66
Independentemente do problema que enfrentar, considere-o simplesmente como um sonho, e pense apenas no Sutra de Lótus (WND, v. 1, p. 502).
Como Daishonin diz, “O que importa é o coração” (WND, v. 1, p. 949 e 1000). O coração humano ou a mente proporcionam suprema dignidade e nobreza à vida. Ao mesmo tempo, pode cair na mais profunda depravação se sucumbir aos impulsos da escuridão ou ignorância fundamental. Transformar o coração é a base para toda mudança duradoura.
Se nos basearmos em nosso coração ou em nossa mente inconstante, não conseguiremos escalar as íngremes cordilheiras fustigadas pelos ferozes ventos das funções malignas. Devemos visualizar o pico sólido e inabalável do estado de Buda e sempre buscar dominar nossa mente. Este é o significado das palavras “tornar mestre de nossa mente, e não deixar que ela nos domine”.
Dominar a mente significa fundamentar-se no inabalável alicerce da Lei. Aqui está a importância dos sutras ou escritos contendo os ensinos do Buda que despertou para a Lei e a propaga. Para nós, praticantes do Budismo Nitiren, dominar a mente significa nos basearmos no Gohonzon e nos escritos do Buda. E, no Budismo, é o mestre que põe os ensinos em prática, que nos ajuda a conectarmos com a Lei. Dominar a mente significa viver com um sincero espírito de procura na fé e, embasados no mesmo 
compromisso entre mestre e discípulo, não se deixando ser dominados pelo egoísmo, pela arrogância nem pela presunção.
Nitiren Daishonin destaca a importância de viver com autodomínio — um domínio fundamentado na Lei — conforme diz a seguinte passagem: “Independentemente do problema que enfrentar, considere-o simplesmente como um sonho, e pense apenas no Sutra de Lótus”. Do ponto de vista da infinita escala da eternidade, qualquer evento ou fenômeno é tão fugaz quanto um sonho. Mas a Lei é eterna. Permitir-se ser derrotado pelas funções malignas e se desviar da Lei serão uma causa para eterno 
arrependimento. Nessa passagem, Daishonin pede a seus seguidores que “pensem unicamente no Sutra de Lótus”, que enfoquem apenas o Kossen-rufu e se mantenham firmes na fé em prol da eterna vitória.
Na época atual, nós, da Soka Gakkai, estamos nos dedicando com toda seriedade a dominar nossa mente com base nesse espírito de abnegado compromisso com o Sutra de Lótus (Nam-myoho-rengue-kyo). Como resultado, demonstramos uma magnífica 
prova real da vitória. Há agora incontáveis membros heroicos — pessoas comuns que se empenham corajosamente na prática budista — no Japão e no mundo inteiro. Essas pessoas são realmente tesouros do Kossen-rufu e da humanidade. Baseando-se na Lei 
e incorporando o espírito da unicidade de mestre e discípulo, conseguiram transformar o carma e estabelecer um estado de vida de felicidade inabalável. E continuam, ao mesmo tempo, a trabalhar incansavelmente para contribuir em prol da 
prosperidade da sociedade e da paz mundial, vivendo uma existência de incomparável significado e dedicada à felicidade de si próprias e também das outras pessoas. Nós entramos numa época em que importantes pensadores do Japão e do mundo 
elogiam os esforços de nossos nobres membros. 

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